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dimanche, novembre 19, 2006

Fatalidades




Hoje em dia as pessoas têm vergonha de dizer “eu te amo”. Sentem-se ressabiadas, tentam inventar coisas, maneiras de fazer tal declaração.
Marta, mulher que pede pouco. Alta e de corpo delgado. Universitária com uma filha. Ulisses, homem de meia idade. Infeliz, separado legalmente. Nunca cursou uma cadeira universitária sequer.
O que essas pessoas têm em comum? O fato de nunca terem se conhecido.
Se se conhecessem que passaria? Nada, não sei. Não vivo em mente nem em coração alheios...








Há gente que pergunta se a vida ‘tá boa, se ‘tá tudo equilibrado, se o dinheiro ‘tá dando ou sei lá que mais...
Mas ninguém pergunta se o coração ‘tá equilibrado, os olhos ‘tão inteiros ou se a alma passa fome.
Um outro dia, minha filha me perguntou o porquê de não ter me casado. Perguntou se eu tinha medo de amar. Ela jura, selando os dedos com os lábios, não fazer pirraça, mau criação e até sorriria se ele a chamasse de filha.
Eu a abracei e lhe beijei a testa. Com meu corpo trêmulo e olhos derretidos fui ao meu quarto, “não é coisa para criança ver adulto chorar”.
A menina me olhando obscenamente fala “você ‘tá chorando, mamãe! Quanto tempo você não ri? Hein?”.
Eu dei um sorriso debochado e seco, então ela rebateu:
“Sei...”
Ela já tem idade para ironizar.
Deitei na cama e me cobri toda até os grandes cabelos, que só me atrapalham. Ouvia meu coração.
“Mamãe, ta na hora de você arrumar um namorado!”, esbravejou-a.
Eu sorri, a puxei para a cama, a abracei e a beijei.
“Isso é coisa de adulto Lóri, de gente grande. Vai brincar com sua filha, pentear os cabelos da Jú...”. Corta-me com ar de criança: “Luisa, mamãe!”.
Sentadas na cama, eu concordo.
“Como ela levanta, embola os cabelos que lhe atrapalham a fronte, ajeita o vestido... Parece tanto comigo...”.
“Posso usar seu pente de cabo branco, mãe?!”, diz com voz de seda.
“Claro, querida, o que é meu é seu!”. Agora choro de emoção. “Como Lóri cresceu... parece mulher em miniatura.”
A menina pega o pente como uma rainha e o agarra nas mãos como uma águia quando vitoriosa tem a sua presa.
“Mamãe, você é feliz?”. Pergunta Lóri.
“Sim querida, eu tenho você”. Sorri.
“E se um dia eu sair?”, me desafiou com os olhos.
“Sair para onde? Para casa de uma amiguinha?”. Esmorecida e ameaçada, contestei.
“Ué, quando eu casar, quando a Luisa virar uma grande bailarina e viajar muiiito, quem vai arrumar o cabelo dela assim como você faz com o meu?!”, diz a pequena advogada.
Muda e de olhos sensíveis, a mãe responde “A mamãe vai entender e...”.
A menina reprova: “Chorando de novo mamãe?”.
“Eu!? Não querida é que...”, disse sem saber o que dizer.
“Mãe, quando a gente se casa, a gente fica triste? Porque eu não quero ficar triste... quero ficar só com a Luisa então”, revela a menina.
Fiquei de rosto claro e a abracei, coloquei-a sentada em meu colo e disse: “Você não ia pentear o cabelo da sua filha?”.
Ela consente com a cabeça e procura o pente na cama.
Nessa hora, o vazio me ocorre assim como a fraqueza dos homens e a insegurança dos deuses. “Quem é essa mulher que me desnuda, me bate na cara com palavras feitas de meu próprio sangue?! O que ela quer me mostrar? O que o mundo quer de mim? O que será a minha redenção?”.
Sem saber ao certo que fazer, seguro Lóri e digo: “Eu te amo, filha minha”. Como essas palavras ecoavam em minha mente “filha minha”...
“Achei o pente mamãe”, cortando meu transe hipnótico.
Penso eu: “Crianças! É verdade, elas não entendem o mundo da dor, da dura realidade. Ai, minha filha!”.
Mais segura de mim, falo: “Agora vá cuidar de sua filha!”.
A menina levanta, abraça a mãe e penteia seus cabelos. Olhando-a nos olhos, diz:
“Já estou cuidando mamãe. Eu também te amo!”.
A mão da menina ampara as lágrimas da mãe. Fala com ar de gente crescida:
“Preciso te arrumar um namorado!!”
As duas riem e se abraçam de prazer.